Muito se tem discutido sobre a exposição de pacientes em procedimentos médicos. Os conselhos federais de cada categoria têm definidos seus próprios protocolos éticos que norteiam a prática do “marketing médico” com importantes orientações. Todo profissional de saúde deve, além do bom senso, ter em mente as normas de seu órgão de classe. Isso basta, não é mesmo? Deveria, mas não basta. Vamos conversar sobre isso?
Em tempos de redes sociais ávidas por imagens e profissionais querendo mostrar o “antes” e o “depois”, urge conversar sobre isso: expor o paciente em um momento de extrema fragilidade é mesmo necessário?
A prática do “marketing médico” sugere alguns procedimentos que devem ser evitados como o “antes” e o “depois” de pacientes para divulgar tratamentos. Ora, a publicidade médica deve obedecer a princípios éticos e de orientação educativa determinada pelo Conselho de cada categoria. E os conselhos orientam sobre a exposição do paciente ferindo a confidencialidade, o sigilo do paciente. Ora, segundo o que descreve a Constituição Federal , “[...] são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação [...] ( Art. 5º. Inciso X) . Expor a intimidade de um paciente seja em que categoria for é um desrespeito ao paciente.
Um dia desses, acompanhando alguns Instagram de profissionais de saúde, me deparei com algumas imagens que chegam a ferir a nossa alma. Até compartilhei com alguns amigos e jornalistas. É mesmo necessário, colocar a imagem (mesmo o paciente autorizando) dessa forma nas redes sociais? Um grupo de profissionais tiraram uma selfie diante de um paciente em plena cirurgia para comemorar o procedimento. Sério que é necessário mesmo parar uma cirurgia para fotografar a equipe? Nada demais, não é? Até que esse paciente seja seu parente, ou parente de algum profissional que está na foto. Qual seria a reação? E cá para nós, custava esperar o término da cirurgia para comemorar?
No o Artigo 20 do Código Civil , encontramos o seguinte texto:
Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais.
O fato é que expor as pessoas em situação vulnerável é um desrespeito ao ser humano . E os protocolos éticos de cada categoria apresentam normas de exibição dos pacientes. Bom seria que cada profissional soubesse dessas regras. E, mesmo que as regras não sejam tão duras, o bom senso é algo gratuito e deveria fazer parte do currículo do profissional de saúde.
Lembro de que na minha vivência de redes sociais como professora, acabei vendo umas imagens de uns alunos, na época, fazendo brincadeiras pesadas com cadáveres no laboratório de anatomia. Você pode imaginar todos os discursos morais e éticos que eles deveriam ouvir, além das punições institucionais a que deveriam sofrer. Printei, enviei para a coordenação do curso e tomaram as medidas cabíveis.
Não é só com humanos que o cuidado deve ser dobrado, animais também. Em laboratório de ensino médio, fundamental, qual o objetivo e a finalidade de fazer experiências com animais e ainda o descarte dos bichos de forma desumana? Pois é. Há regras, limites, protocolos, mas alguns ainda fazem e exibem em redes sociais. Mas isso, que deveria nos deixar enojados e revoltados, é normalizado ao longo dos anos. Profissionais de saúde que exibem seus pacientes em procedimentos, desprotegidos e ainda sob a legenda de: “imagem autorizada”. Imagino o paciente levantando do procedimento, com o corpo aberto e assinando uma autorização para o profissional o colocar em redes sociais. Sério isso? Claro que estou exagerando no exemplo. Mas que o assunto merece a atenção de todos, é inegável.
Quem nunca se sentiu invadido por aquelas batas de hospital que nunca fecham, são pequenas, deixam a parte de trás descoberta e você tem que ir de um lado para o outro segurando-as inutilmente. Nada mais humilhante. Imagina exibir esse paciente em redes sociais em pleno procedimento.
Quando falamos em humanização , precisamos saber como o outro se sente. Já disse aqui e repito: ninguém vai ao hospital a passeio. No mínimo, fazer uma visita a um parente/amigo hospitalizado. Ir a um hospital/clínica/consultório é estar em situação vulnerável. E o que fazer para que esse momento seja menos dolorido para quem procura os serviços médicos? Oferecer atendimento humanizado, afetuoso e de profundo respeito.
Já vi de tudo em hospital, seja como paciente, como acompanhante ou como professora. Muitas histórias para lamentar e outras para honrar profissionais de saúde.
Mas a lição maior que deixo nesse início de ano, é que antes de postar uma imagem para mostrar o seu trabalho, observe não apenas os protocolos éticos de sua categoria, mas use o bom senso. No mais, remeto a minha preocupação às faculdades, universidades, centros universitários das áreas de saúde, com o questionamento, sobre que profissionais estamos formando ao não dar importância às disciplinas de Ética, Humanização, Habilidades de Comunicação, Ciências Sociais em seus currículos para sejam realmente generalistas?
Um profissional ético, prioriza o paciente, seja ele humano ou animal, preservando-lhe a integridade em todos os sentidos, proporcionando sigilo, respeito, afeto e principalmente, humanidade. Concorda? Deixa seu comentário.
Fantástico! Totalmente necessário discutir sobre isso! Se vê muitos profissionais antiéticos e desumanos. É necessário quebrar esse ciclo. 👏🏼👏🏼👏🏼
ResponderExcluirValorizar o profissional que faz o seu trabalho com ética e humanizaçã. Tenho uma lista enorme deles e evitar que os excessos ocorram em qualquer área a fim de priorizar a segurança do paciente.
ExcluirSaudações. O Instagram tem transformado o modo como as pessoas lidam com a intimidade, além de outras plataformas. Hoje, para o profissional divulgar seu expertise, abre mão da austeridade profissional e se "tiktokiza", dança, rebola, gesticula. Com relação ao tema aqui abordado, a prática médica tem sido colocada em xeque por conta desse novo debate que se apresenta: é ético criar necessidades acessórias em indivíduos sadios?
ResponderExcluirEu me deparei, meses atrás, com outra situação preocupante nas redes sociais: profissionais de saúde que quebram o sigilo da consulta e narra como se fosse uma pequena crônica visando curtidas e comentários e a consequente popularização do seu perfil. Me deparei com uma postagem desse calibre de um médico que eu havia recém visitado. Eu disse que ele estava sendo antiético e ele me rebateu dizendo que o código de ética da profissão não enxergava assim. E aí? Deve existir limite para o bom senso?
Bom senso está acima de qualquer protocolo. E sim, os Conselhos têm seus normativos, duvide que eles apoiem esse tipo de comportamento.
ExcluirDira, parabéns pelo artigo que deveria ser estudado nas aulas de Ética Profissional de qualquer área. Um profissional sem visão interdisciplinar e transversal já está com graves lacunas de formação! Daí que todos, todos mesmo, devem ter noção mínima do que você expôs com objetividade e elegância. Pegou até leve em razão dos absurdos que se pratica por aí! :)
ResponderExcluirVerdade, Abel. Como eu disse, já coleciono histórias de ambientes de saúde, do salão de beleza/estética ao hospital. Precisamos exaltar o bom senso e buscá-lo a todo custo.Obrigada pela leitura.
ExcluirTotalmente necessário dialogar sobre esse assunto! O mesmo tem abrangência imensa, realmente seria necessária tanta exposição???
ResponderExcluirNa minha opinião esse tema tem realmente que ser discutido no meio científico.
Isso, do inicio, da formação... precisa ser ensinado, discutido e vivenciado. Concordo.
ExcluirParabéns bem elaborado
ResponderExcluirObrigada pela leitura.
ExcluirSabia como sempre.
ResponderExcluirEssa moça sempre cirúrgica
Opa. Grata pela leitura. Gostei do cirúrgica.
ExcluirAmei a leitura, estrito divinamente!
ResponderExcluirObrigada, sócia!!!!
ExcluirMuito bom! Parabéns pelo seu texto
ResponderExcluirObrigada pela leitura, Prof. Paiva.
ExcluirProfessora Dira, suas observações são muito pertinentes e bem oportunas. Quem entra num hospital ou clínica de saúde para ser submetido a um procedimento médico, não importa qual, está com estado alterado de consciência e vulnerável. Não pode medir as consequências de uma eventual autorização para que sua imagem seja divulgada. Parabéns.
ResponderExcluirNélio, obrigada pela leitura e comentário, precisamos falar sobre isso e sobre a vulnerabilidade de quem sofre. Mais afeto e cuidado para todos. Abraço, meu querido.
ExcluirNão poderia ser mais oportuno e elucidativo o texto. Acrescento: o texto é pedagógico e necessário que seja lido tanto por profissionais que expõem esses tão falados "antes" e "depois" dos pacientes. Por várias razões: ãs vezes o "depois" é exposto vom tão pouco tempo após o procedimento, que não dá pra diferenciar do "antes"; já vi fotos do depois de pacientes tão inchados que eu desejei que eles voltassem pro "antes". Outro aspecto: os pacientes podem autorizar, mas será tinham ciência do alcance da exposição de seu quadro? De que forma essa autorização foi obtida? Que meios e artifícios foram usados? Mais um aspecto: a extrema exposição mostra muitas vezes que o profissional executor teve muitas pessoas que se deixaram fotografar, mas que, em minha humilde opinião, as fotos me fizeram muito mais pensar em capitular em me submeter a tal procedimento. O efeito marketeiro muitas vezes é contrário ao desejado. Relato aqui um caso pessoal: já me submeti a uma rinoseptoplastia, onde a médica foi extremamente profissional. Corrigiu aquilo que tinha que sido pedido, de uma forma tão elegante que quase ninguém lembra do que eu tinha antes. Sutil, elegante e precisa. A maior propaganda foi a que fiz em mostrar a excelência do trabalho dela. Parabenizo mais uma vez à autora do artigo pela oportunidade de comentar esse tema tão necessário, por meio desse brilhante artigo.
ResponderExcluirFico feliz por sua leitura e discussão que é um tema que nos incomoda sejamos da área de saúde, do direito ou como cidadãos comuns. Obrigada por partilhar sua opinião conosco.
ExcluirParabéns,precisamos de profissionais que tenham comprometimento com valores ético e humanos
ResponderExcluirSim, Cleide. Precisamos de profissionais que sigam mais que seus Conselhos de Classe...sigam o bom senso.
ExcluirE vou além com as discussões dos conselhos federais e estaduais das categorias em saúde quando o assunto é a exposição desses corpos x estética x ética x informação. Até que ponto as fotos dos antes e depois realmente servem como estímulo positivo sem causar, mais uma vez, normalização de padrões de beleza?
ResponderExcluirSim. É verdade, professora. No entanto sabemos que a decisão do procedimento é um direito do paciente, mas a sua segurança é dever do profissional.
ExcluirTexto muito pertinente. Cada vez mais vemos esse tipo de "marketing". O conselho de Fisioterapia não permitia o "antes e o depois" até um tempo atrás, mas foi vencido e agora é permitido. Foi vencido pq os profissionais utilizavam deste recurso mesmo assim.
ResponderExcluirLucas
Exato, Lucas. Não tem como punir se não for por denúncia. No final, atropelados a ética e engolimos o bom senso.
ExcluirMuito pertinente a sua colocação, a maioria desses profissionais estão banalizando a ética, através das redes sociais ,expondo o ser humano como uma mera mercadoria, não exercendo a humanização, e sim, o mercantilismo e o exibicionismo. Parabéns Dira!!!
ResponderExcluirCarmem Almeida🖕
ExcluirOi Carmem, precisamos tanto ainda discutir para que consigamos mudar esses comportamentos danoso... mas vamos continuar a luta.obrigada pela leitura.
ExcluirParabéns pelo seu texto Dirá!
ResponderExcluirObrigada pela leitura.
ExcluirParabéns pelo seu texto Dira! Lili
ResponderExcluirGrata, Lili.
ExcluirO texto é bem pertinente para o momento que estamos vivendo, em que o profissional para ser reconhecido, precisa estar constantemente ligado às redes sociais e exercer a função de "blogueiro" mostrando o resultado de seu trabalho para acumular "seguidores" e assim, ser valorizado dentro de sua categoria. As disciplinas básicas do início do curso são indispensáveis para formar esses profissionais no âmbito da ética, cabe à esse profissional saber impor limites (ainda que permitidos pelo seu conselho) e saber que a dignidade daquele seu paciente, deve estar em primeiro lugar.
ResponderExcluirPerfeito. Resumiu bem o meu entendimento. Obrigada, querida.
ExcluirParabéns pela matéria. Muito importante falar sobre esse tema. Temos que ter ética profissional acima de tudo.
ResponderExcluirExato. Ética e bom senso só iluminam o mundo.
ExcluirEscrevi um longo comentário que se perdeu, mas posso resumi-lo dizendo que como paciente crônica e grave por mais de 25 anos, coleciono histórias de invasões ditas profissionais ao meu campo pessoal.
ResponderExcluirPenso que não basta bom senso individual para sobrepujar uma situação em que diversas pessoas e personalidades lideram ou dominam. A profundidade da questão exige a base de uma educação no conviver. O respeito nem sempre nasce sozinho, precisa ser tocado e exercido consigo mesmo e com o outro. E é a educação que o desperta e torna éticos um tratamento
ou a simples convivência.
Muitas vezes fui desrespeitada e invadida e sempre consegui engolir em seco,mas uma vez uma professora dentista m3 fez chorar: ela pediu para o especialista em formação que me cobrisse a boca em determinado momento, demonstrando respeito e empatia quando eu, paciente(mente), estava exposta. Foi lindo o que precisa ser o comum e o normal. Temos ainda muito trabalho pela frente, querida colega educadora.
P.S.: Vou publicar sem ler, senão perco o texto de novo.
Muito bom ler seu relato e sua indignação. Queria muito que os profissionais de saúde lessem os comentários. Obrigada, anja.
ExcluirO seu texto me reportou ao "Velho de Restelo" - Camões. Qdo as naus saíam em busca de "fama, dinheiro". Infelizmente, essa cobiça pela fama, dinheiro e visibilidade chega a todos os setores. Obrigada pela reflexão.
ResponderExcluirInfelizmente. Obrigada pela leitura.
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